.
Vanguarda Operária

Nº 7, janeiro de 2003

Romper com a Frente Popular de Lula
Por um partido operário revolucionário!

Governo PT/PL: Bombeiro do FMI

Lula encontra Bush nos EUA, 10/12/02
O show de George e Lula: o novo presidente brasileiro estende a mão a seu amo, o imperialista-chefe George Bush II. (Foto: O Globo)

O dia da posse do novo presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, mais de 150 mil pessoas festejaram em Brasília. Centenas de ônibus saíram das cidades principais do país, contingentes de indígenas vieram dos cantos mais distantes da Amazônia para celebrar. “Foram festejar o triunfo do seu presidente, do presidente que pela primeira vez representa o povo”, comentou a Tribuna da Imprensa (2 de janeiro). Num contraste com a sucessão de politiqueiros corruptos que têm ocupado o Palácio do Planalto depois da queda do regime militar, houve um sentimento de que Lula é “um de nós”. 

Mas além da euforia popular, a dura realidade é, que o ex-sindicalista e chefe do social-democrata Partido dos Trabalhadores (PT), que foi eleito junto com seu vice, o industrial José Alencar do direitista Partido Liberal (PL), vai presidir um regime burguês que governará o país não em interesse do “povo” senão pelo lucro da Bovespa e Wall Street. Anuncia com grande barulho seu programa assistencialista de “Fome Zero”, mas vai implementar as políticas de fome do Fundo Monetário Internacional. A tarefa que os donos do Brasil têm conferido em Lula é de conseguir que as massas trabalhadoras engulam as “reformas” anti-operárias que seus antecessores direitistas não alcançaram impor.

O Lula foi selecionado como mandatário do país desta vez, em sua quarta campanha presidencial, principalmente devido à crise econômica generalizada que abrange a maior parte dos países da América Latina, à “moderação” de seu programa e ao fato de que os trabalhadores que votaram por ele serão firmemente encandeados a seus inimigos de classe. Como nas campanhas anteriores, o PT formou uma coalizão de colaboração de classes tipo “frente popular” como garantia de suas “boas intenções” frente ao capital. Mas desta vez o “aliado” capitalista foi ainda mais direitista que no passado: o Sr. Alencar é o rei das camisetas produzidas a salários de fome pelo Walmart e chefe da igreja de turma para esvaziar os bolsos dos pobres.

Ao nível continental, Lula vai cumprir com os requisitos dos amos imperialistas em Washington. Depois de uma visita com o presidente norte-americano, Lula declarou que voltaria ao Brasil “convencido de que terei no presidente Bush um importante aliado” (O Globo, 11/12/02). Como primeiro encomendado, ainda antes de tomar posse, o presidente eleito intervem na crise venezuelana. Ao mesmo tempo que FHC envia um navio petroleiro para substituir o petróleo faltante devido ‘a greve  patronal, o Lula envia um emissário a Caracas que aconselha ao presidente Hugo Chávez a chegar a um conchavo com a oposição de direita. Daqui a pouco tempo pode-se esperar que o mandatário brasileiro dará lições de política econômica “responsável” ao governo argentino do presidente Duhalde, considerado “menino mau” pelo FMI, devido à gastança dos governadores peronistas . Assim cumpre seu papel de bombeiro latino-americano do consórcio banqueiro imperialista. 

Anteriormente, o chefe do PT havia declarado que a Área de Livre Comércio da América seria “equivalente à anexação do Brasil pelos Estados Unidos”. Este foi um dos pontos que mais apreciaram  nele os “anti-globalizadores” do Fórum Social Mundial. No passado, Lula foi uma das “estrelas” do FSM. Embora, na audiência com o chefe do imperialismo ianque o presidente eleito do Brasil declarou que “a ALCA pode representar a abertura dos mercados dos EUA e Canadá” aos produtos brasileiros, “sobretudo no setor agrícola”.  Assim, em recompensa do apoio que lhe tem dado em sua campanha presidencial capitalistas como Ademerval Garcia da Associação Brasileira de Exportadores de Laranja, Brasil se convertirá numa “república laranjeira”. Mas isto seguramente não diminuiria o entusiasmo pelo novo governo entre os frente-populistas pequeno-burgueses e burgueses que se reúnem cada ano em Porto Alegre.

Ao nível interno, o governo lulista vai impor a “reforma previdenciária” que o governo FHC fracassou em implementar. O Lula agora propõe um teto de R$2.200 (dez salários mínimos), ou seja menos de US$700 ao mês. Isto não é um caso isolado. Pouco mais de um mês de sua eleição, Lula convidou centenas de sindicalistas ao Hotel Sheraton de São Paulo para anunciar que “a partir de agora acabou a moleza”. No mesmo discurso anunciou que “de não tiver condições” nem sequer vão pagar o ridículo salário mínimo vital que propugnou o PT durante a campanha (O Globo, 27de novembro de 2002). Logo anunciou que no lugar dos R$240 prometidos, somente serão R$210!

Lula no convite com sindicalistas 11.02 Lula no convite ao Hotel Sheraton onde anunciou aos sindicalistas, “a partir de agora acabou a moleza”, São Paulo, novembro de 2002.

Tudo isto relegaria a “esquerda petista” a uma situação marginal. Quando foi nomeado como novo chefe do Banco Central o tucano Henrique Meirelles, Heloísa Helena, senadora do PT de Alagoas e porta-voz da corrente petista Democracia Socialista, exclamou: “Estou triste!” O antigo presidente do Banco de Boston no país deve “estar a serviço do capital financeiro” (O Globo, 13 de dezembro de 2002).  Que surpresa! Outra estrela da DS, o ex-prefeito de Porto Alegre Raul Pont, se queixou, “Não entendi nada.” A senadora alagoana recusou candidatar-se ao governo do estado por não querer compartilhar a chapa com velhos inimigos como os tradicionais coroneis de Alagoas. Mas a tristeza e a incompreensão da ala esquerda domesticada do PT não vai além de algumas lágrimas. Eles mesmos têm proferido amplos serviços ao capital.

Assim, o governo de Olivío Dutra no estado do Rio Grande do Sul, onde a esquerda petista teve grande presença, respondeu à greve dos professores com mão de ferro, não concedendo nada para os educadores que recembem alguns dos piores salários da república. Na prefeitura da capital gaúcha, Raul Pont fez gala da “democracia participativa” de seu “orçamento popular”. Mas a dura realidade foi que celebraram audiências populares para aprovar um programa de cortes nos programas sociais municipais. E em todo caso, estes “esquerdistas” têm acompanhado fielmente  Lula  no frentepopulismo que tem sido a marca das campanhas eleitorais do PT desde as prefeituras de Porto Alegre, São Paulo e Belém até aos governos estaduais do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Acre e Mato Grosso do Sul. .

A esquerda pseudotrotskista segue os tacões de Lula

Na véspera das eleições presidenciais, a imprensa burguesa fingia escandalizar-se pela presença de “radicais” no PT, sinalando que até 26 dos 91 deputados da bancada petista se consideram esquerdistas (ver “O que querem os radicais do PT”, Veja, 23 de outubro de 2002). “Descobriu” que a DS se pretende trotskista, que são partidários da corrente do Secretariado Unificado (SU) anteriormente dirigido por Ernest Mandel. Atribuem à DS 10 por cento dos militantes do partido; na burocracia petista são ainda mais numerosos, constituindo grande parte do aparelho a serviço da Articulação, a corrente majoritária de Lula, José Genoíno e José Dirceu. Outro componente da franja de esquerda do partido, O Trabalho, segue a pauta da corrente internacional dirigida pelo pseudotrotskista francês Pierre Lambert. Um terceiro agrupamento, Força Socialista, relativamente numerosa no estado do Rio de Janeiro, é de obediência stalinista.

Se a mídia burguesa brasileira quer imitar suas colegas inglesas em fazer escândalo pela presença de “vermelhos debaixo da cama” (reds under the bed), a realidade é que estes reputados esquerdistas são bem mais uns rosados pálidos. O trotskismo autêntico defende a necessidade de uma direção revolucionária independente, como o partido bolchevique chefiado por Lênin e Trotsky que tomou o poder no império russo na Revolução de Outubro de 1917, originando o primeiro estado operário da história. A política destes impostores, pelo contrário, é de seguir às forças reformistas maiores, como o PT no Brasil ou o Partido Socialista na França, no lugar de construir um partido operário leninista-trotskista.

Se a sorte das diversas correntes da esquerda petista é bem triste, seus companheiros pseudotrotskistas “exteriores” não têm perspectivas mais prometedoras. Agora que Lula colheu 56 milhões de votos, os dois grupos principais da “extrema esquerda”, o PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado) e PCO (o Partido Causa Operária) lançaram candidatos à presidência que receberam 400,000 (José Maria Almeida) e 40.000 (Rui Costa Pimenta) votos respectivamente no primeiro turno das eleições. O maior, o PSTU, chamou a votar em Lula no segundo turno, mesmo admitindo que “não acredita que um possível governo Lula irá melhorar a vida do povo”. Por que, então, apoiar a candidatura dele? Sua resposta expressa nitidamente a óptica comum a todos estes oportunistas que abusam do nome da Quarta Internacional: “Como os trabalhadores acreditam em Lula e, sobretudo, querem a derrota eleitoral de Serra, o PSTU se somará à classe trabalhadora e ajudará a chamar o voto em Lula e a elegê-lo”, anuncia o boletim do PSTU. É aqui uma expressão quimicamente pura do seguidismo como programa.

O PSTU segue a linha do falecido dirigente pseudo-trotskista argentino Nahuel Moreno, quem teve gosto indiscriminado quanto às correntes que seguia: primeiro o peronismo, seguido pelo castrismo, maoísmo, guevarismo, um episódio social-democrata sobe o segundo governo Perón, seguido por uma aventura guerrilheira com os sandinistas nicaragüenses e um livro de elogios aos mulahs iranianos, para logo se converter em campeão de uma suposta “revolução democrática” (palavra de ordem também de Ronald Reagan) que teve sua expressão concreta no apoio aos nacionalistas polacos anti-soviéticos de Solidarnosc e aos muyajedin (“guerreiros santos”) afegãos. Após a sua morte em 1986, os morenistas do PSTU elogiaram a tomada de poder por Yeltsin em agosto de 1991 como uma “segunda revolução russa”. Para os reformistas que participaram na destruição contra-revolucionária da União Soviética, o que foi uma derrota histórica do proletariado mundial, votar pela frente popular de Lula é mais uma traição.

O PCO, seguidores do centrista argentino Jorge Altamira, decidiu finalmente chamar a votar nulo no segundo turno, devido à “política enganosa da Frente Popular dirigida pelo PT” e por que a candidatura de Lula “não é uma candidatura operária ou até mesmo de esquerda, mas uma candidatura patronal” (decisão da XII conferência do PCO, Causa Operária, 2 de novembro de 2002). E como justifica o PCO seus chamados a votar por Lula, “candidato operário” segundo eles, nas eleições de 1989, 1994 e 1998? Acaso a Frente Brasil Popular (1989) e a União do Povo nos anos posteriores não foram frentes populares? Para o PCO, uma frente popular não se define pelo critério marxista de classe, como uma aliança de colaboração de classes que subordina aos trabalhadores à setores capitalistas através de uma coalizão com partidos burgueses, e sim pelo critério da política burguesa, do seu posicionamento na escala esquerda-direita. Então, sendo a aliança Lula/Alencar, mais à direita, não se pode votar em Lula como faziam antes. A política do PCO é a de frentepopulistas decepcionados, que queriam que Lula fizesse uma aliança um  pouco mais à esquerda.

O mesmo critério sobre a frente popular é compartilhado também por grupos que ostentam uma retórica mais esquerdista. A Liga Bolchevique Internacionalista (LBI) ostensivamente chamou pelo voto nulo nas eleições presidenciais, sinalando o caráter abertamente direitista da aliança PT/PL. Mais às vésperas do primeiro turno, a LBI lança uma advertência (4 de outubro) contra o que consideram “a maior fraude da história para garantir a realização do 2º turno”. Ali convocam “todo o ativismo classista, independente da decisão de estarem apoiando Lula ou mesmo José Maria (PSTU), a realizarmos a denúncia vigorosa da fraude em curso e, caso esta se concretize, como tudo indica, a deflagrar uma ampla mobilização nacional, que culmine em uma paralisação ativa contra a fraude eleitoral”. Ou seja, a LBI pretende não dar apoio político nenhum a Lula, mas sobe a cobertura de uma luta contra a fraude, chama o “ativismo” a sair na rua para insistir que o TSE pronuncie a vitória do candidato da frente popular já no primeiro turno!

Tanto os falsificadores do trotskismo que chamaram a votar como estes últimos que pretendiam se opor à frente popular querem estar com o “fenômeno Lula”. Prova disto é que após às eleições todos têm uma política quase idêntica, de apoiar as lutas das massas que acham que se produziria a raiz da vitória de Lula, e assim pressionar ele. (Há diferenças de formulação, o PSTU diz que estas lutas serão resultado das “expectativas” das massas, agora que o PCO insiste que serão produto das “tendências revolucionárias das massas”, mas em todo caso, a política é a mesma.) O dirigente do PCO, Rui Costa Pimenta o diz com todas as letras que é necessário “pressionar todas as organizações que estão na base deste governo e que participam dele direta ou indiretamente (CUT, MST, o próprio PCdoB, o PT, os sindicatos, a UNE etc.) para que rompam com a burguesia e ingressem na via do atendimento das reivindicações das massas trabalhadoras e do governo próprio da classe trabalhadora” (Causa Operária, 2 de novembro de 2002). O PCO até nega que o PT seja um partido operário de qualquer tipo, mas aqui chama ao mesmo a romper com a burguesia! Um pouco tarde...

Característico também que estes chamam agora à formação de um novo “partido operário de massas” ou outra variante do mesmo que seria nos fatos, um PT bis, com um programa ligeiramente à esquerda do atual, ou seja, de voltar ao PT “das origens”.  A Liga Quarta-Internacionalista do Brasil, pelo contrário, chama por forjar um partido operário revolucionário, baseado no programa da revolução permanente de Trotsky. Insistimos que na época imperialista, mesmo as reivindicações democráticas mais elementares não se podem obter sem uma revolução operária, apoiada pelos camponeses, e sua extensão aos centros imperialistas. O PCO, por exemplo, fala, na questão agrária, da nacionalização do solo, que no fundo é somente uma demanda democrática, e porquê “toda a terra seja distribuída em forma de concessão” aos camponeses, sobe um “governo operário”, o que na boca deles quer dizer um governo PT bis. A LQB chama não por uma reforma agrária de um governo petista mais a esquerda, senão pela revolução agrária, que os camponeses tomam a terra mesma numa tumultuosa sublevação, onde não aguardam a chegada dos funcionários de alguma agência de reforma agrária senão que tomam eles mesmos a casa grande, em apoio da insurreição operária nas cidades e que a terra nacionalizada das grandes fazendas e complexos agroindustriais seja trabalhada em forma coletiva.

Agora que os pseudotrotskistas falam de não depositar confiança no governo de Lula, a LQB diz abertamente que o governo PT/PL é o governo do inimigo de classes, e que os operários e camponeses, os trabalhadores urbanos e rurais, devem preparar-se para resistir os ataques deste governo burguês da frente popular. Hoje, pelo caráter abertamente direitista da aliança PT/PL, muitos grupos que falsamente ostentam o nome trotskista dizem que não podem apoiar a Lula. Mas a LQB é a única organização da esquerda brasileira que tem defendido a política autenticamente trotskista de não dar nenhum voto a nenhum candidato ou partido de uma frente popular. Nós baseamos sobre a política de Leon Trotsky mesmo, que durante a Guerra Civil espanhola escreveu:

“Os operários e os camponeses somente podem lograr a vitória quando combatem por sua própria emancipação. Submeter eles, nestas condições, à direção da burguesia significa garantir com antecipação a derrota na guerra civil.
“Estas verdades não são, de nenhuma maneira, fruto de uma análise puramente teórica. Representam, pelo contrário, a conclusão irrefutável de toda a experiência histórica, pelo menos depois de 1848. A história moderna das sociedades burguesas está infestada de frentes populares de toda espécie, ou seja, das mais diversas combinações políticas aptas para enganar aos trabalhadores. A experiência espanhola não é senão uma ligação trágica nesta cadeia de crimes e de traições.”
–Leon Trotsky, Lição de Espanha, última advertência (dezembro de 1937)

Ao contrário do estreito nacionalismo da esquerda frentepopulista brasileira, a LQB luta pelo internacionalismo proletário revolucionário. Nós como nossos camaradas nos EUA também lutamos por defender o Iraque e derrotar os imperialistas. Defendemos a Corea do Norte contra as ameaças e a chantagem nuclear de Washington. Igualmente defendemos a China, Vietnam e Cuba contra a contra-revolução interna e externa. A Liga Quarta-Internacionalista do Brasil, seção da Liga pela Quarta Internacional, luta pela oposição classista a toda frente popular, por um partido operário revolucionário e por reforjar uma Quarta Internacional autenticamente trotskista. Junta-se a nós! n



E-mail: internationalistgroup@msn.com 

Voltar à página principal da LIGA QUARTA-INTERNACIONALISTA DO BRASIL

Voltar à página do INTERNATIONALIST GROUP