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Vanguarda Operária

abril de 2014

Organizar  comitês de defesa operária da favela,
dos protestos e movimentos sociais

Não à Copa da repressão no Rio:
Frente popular lança guerra contra a favela


A polícia invade a favela da Maré, 27 de março de 2014.  (Foto: Ricardo Moraes/Reuters)

ANIVERSÁRIO DO GOLPE MILITAR – O dia 31 de março marcou o 50º aniversário do golpe de estado militar-civil que derrubou governo de Jango Goulart e instaurou 21 anos de sanguinária ditadura militar, de tortura, de desaparecidos, de repressão contra os trabalhadores e pobres. Passeatas na rua com retratos das vítimas proclamam, “Nunca mais”. Colóquios, debates e filmes nas universidades sobre a “transição democrática”. Mas também um deputado na Câmara federal e um professor da USP elogiam o golpe. A Folha de S. Paulo (30/04/2014), que apoiou fervorosamente a tomada de poder pelos generais e que em 2009 causou escândalo ao referir-se à “ditabranda” brasileira, publicou um editorial auto-justificativo dizendo que “as opções de então” eram “bem mais adversas” e ressaltando o crescimento econômico sob o regime castrense, devido a qual sustenta, incrivelmente, que “todas as camadas sociais progrediram”!

“NUNCA MAIS?” Após dez anos de governo de Frente Popular de Lula/Dilma, do PT e os partidos reformistas e burgueses aliados, a tortura e os assassinatos seguem sendo prática comum das múltiplas polícias. Também as chacinas dos moradores de favelas e camponeses, e no aniversário mesmo do golpe de 1964, uma invasão militar-policial às favelas do Complexo da Maré no Rio de Janeiro. Participam mais de 1.500 militares e  tropas, incluindo PMs do BOPE e BOE e fuzileiros da Marinha com 21 blindados. Imediatamente caiu o primeiro jovem baleado pelos invasores. Seis dias depois, o segundo golpe: nova ocupação da Maré, com 2.700 efetivos do Exército. Uma semana após, o dia 11 de abril, a brutal desocupação da “favela da Telerj” em terreno da empresa Oi no Engenho Novo, utilizando gás e balas de borracha, o que despertou uma resistência feroz dos moradores. Mais recentemente, dois moradores da Maré são fuzilados em três dias pela polícia.

COPA DO MUNDO – Esta verdadeira guerra contra a população das zonas mais empobrecidas está intimamente ligada aos preparativos para a Copa do Mundo de futebol, a partir do dia 12 de junho o, quando os governos municipal, estadual e federal, e a burguesia do pais em conjunto, querem colocar em vitrine a “Cidade Maravilhosa”. O complexo da Maré é estrategicamente situado entre três vias expressa (as Linhas Amarela e Vermelha e Avenida Brasil) e o ponto de acesso ao Aeroporto Galeão. Distúrbios ali poderiam ter um impacto grande na Copa: um engarrafamento de tráfego como houve na visita do Papa o ano passado seria um desastre. Assim, na expectativa de ter no Brasil personalidades de grande expressão no mundo do futebol e “ilustres” autoridades políticas de vários países, a classe capitalista brasileira decidiram instalar uma ditadura militar sobre os 130.000 moradores da Maré e do meio milhão nas outras favelas e morros do Rio.

O movimento operário deve mobilizar sua força já para defender nossas irmãs e irmãos de classe. Por isto o Comitê de Luta Classista, corrente de oposição sindical ligada à Liga Quarta-Internacionalista do Brasil, apresentou uma moção às assembleias do SEPE-RJ (magistério) e SINDSPREV-RJ (saúde) propondo: “Expulsar as tropas de ocupação pró-imperialistas do Haiti, das favelas e dos movimentos sociais”. As moções, que foram aprovadas pela rede estadual do SEPE e pelo SINDSPREV, chamam por mobilizar aos sindicados contra os ataques da polícia, e pela formação de comitês de defesa operária com base nos sindicatos para proteger as favelas a os protestos. (O texto da moção é reproduzido ao final deste boletim.) Como dizia uma faixa que aparecia depois da matança na Maré no meio das jornadas de junho do ano passado, “A polícia que reprime na avenida é a mesma que mata na favela”. Fazemos deste 1° de Maio o ponto de arranque desta luta de classe contra a Copa da repressão da burguesia.

Enquanto a classe dominante imagina possíveis atos terroristas contra os notáveis visitantes, as favelas cariocas já vivem sob o terror do Estado. Desde algum tempo o Complexo da Maré tem em seu redor muralhas de aço, há pelotões de militares fortemente armados nas entradas, e agora em seu interior milhares de militares de tropas que vão ficar até depois da Copa. Para os capitalistas racistas, as favelas são uma enorme mancha negra, fração carioca e fluminense da massa de oprimidos e explorados que produzem suas riquezas, mas ao mesmo tempo constituem um perigo para seu domínio de classe. A elite burguesa branca em suas casas e mansões opulentas sob os braços do Cristo Redentor insiste em manter sob seu chicote os descendentes de escravizados. Para ela, a frase do Manifesto Comunista que o proletariado será coveiro da burguesia é um pesadelo constante, porque os potenciais coveiros vivem justamente lá acima, só precisa descer dos morros, da Rocinha para Leblon, da Cidade de Deus à Tijuca, etc.

O pesadelo da classe dominante não é novo, e seu “remédio” tampouco. Poucos meses após a monarquia decretar a em 1888 a “Lei Áurea” abolindo finalmente a escravidão, uns golpistas ex-proprietários de escravos proclamaram a república como vingança, e militarizou os corpos policiais. Os donos da Velha República mantiveram seu domínio de classe usando os métodos de antanho (ver “O Brasil de Lula: Terra de massacres”, Vanguarda Operária No. 9, maio-junho de 2006). Como bem definem os versos da música “O Almirante Negro” de Aldir Blanc e João Bosco, “Rubras cascatas jorravam das costas dos negros, entre cantos e chibatas”. Porém, no ano 1910 os senhores em suas nobres residências desenhadas com a arquitetura francesa de estilo Belle Époque tremiam quando viam na Baía da Guanabara os mastros dos navios ocupados pelos marinheiros dirigidos pelo Almirante Negro João Cândido na “Revolta de Chibata”, fazendo cessar o uso deste resquício da escravidão.

A atual ocupação militar nas favelas cariocas, particularmente no Complexo da Maré, com cerca de três mil militares, potencial bélico moderno, semelhante ao que se usa numa guerra convencional, desta vez é dirigida por governos de frente popular. O agora ex-governador Sérgio Cabral Filho (PMDB) agradeceu o apoio “primordial” de sua aliada Dilma Vana Rousseff (PT) na “histórica” ação militar (O Dia, 31/03/2014). Assim dão provas que o racismo é questão de Estado, é institucional, orgânico ao domínio burguês nesta terra do Pau Brasil, que todos devem cumprir: governo de direita e governo de “esquerda”. Os críticos liberais, reformistas e centristas de todos os naipes, gritam: “Isso é fascismo! Cadê a democracia?

A resposta pode ser encontrada lendo a história do massacre de Canudos, da Revolta da Chibata, dos massacres de Eldorado dos Carajás, Candelária, Carandiru, a desocupação brutal da Aldeia Maracanã. Ou simplesmente observamos a sorte horripilante de Cláudia Silva Ferreira, auxiliar de serviços gerais, que no dia 16 de março, que após sete meses do sumiço de Amarildo nas mãos da polícia da UPP da Rocinha, foi atingida por um tiro durante operação policial no Morro da Congonha, na Zona Norte do Rio. Ela foi transportada dentro do porta-malas do camburão da PM e acabou caindo do carro. Presa pela roupa foi arrastada por cerca de 250 metros. Isso é um dos muitos registros sinistros e macabros que confirmam mais uma vez que nossa República e Democracia já nasceram banhadas de sangue negro, indígena e de pobres.

Não, não é fascismo, por mais que alguns dos elementos repressivos empregados nas ações policias sejam fascistóides, É mesmo a democracia, como foi idealizada em seu berço, na Grécia antiga, onde os debaixo (escravos, mulheres, estrangeiros, os que não eram proprietários de terras) foram excluídos das decisões da elite. No caso carioca, e sua versão de democracia, tem todo um toque especial, num governo dirigido por uma aliança entre liberais burgueses (PMDB), social-democratas (PCdoB) e “governo dos trabalhadores” (PT), que busca inspiração no formato e nos piores métodos repressivos dos gorilas golpistas civis-militares de 1964. Hoje alguns dos que foram vítimas da ditadura militar, como a ex-guerrilheira e atual presidenta Dilma, enviam os militares para instaurar uma ditadura policial no Complexo da Maré e outras favelas. Assim é a democracia maravilhosa que vive a cidade do Rio.

No caso da Maré agitaram o pretexto de fazer “Guerra às Drogas”. Isto beira ao ridículo, como tentar matar passarinho com um canhão. Os capitalistas marginais que atuam na venda das drogas, controladas pelas “milícias” dirigidas por policiais e bombeiros militares, são muito pobres comparados aos Eike Baptistas, Benjamin Steinbruch e outros grandes capitalistas monopolistas que sustentam os governos frente-populistas. E desde quando vender e consumir drogas podem ser considerados como “terrorismo”? Ora, os capitalistas das drogas só querem vender sua “mercadoria”, tanto como fazem os capitalistas de outras drogas (cigarros, bebidas alcoólicas...) e capitalistas de um modo geral. Tanto quanto os capitalistas da Copa do Mundo, querem apenas lucrar!

Por isso, o mais sensato e racional, seria liberar a maconha e todas as leis contra a droga e assim acabar com o tráfico criminoso, e se for o caso dar tratamento adequado aos que quiserem abandonar o uso. Então se enfrentará a realidade que o uso de drogas tem crescido em muito dos casos por uma pressão e opressão sobre a juventude cada vez mais sem perspectiva e sem emprego num capitalismo em avançado estado de putrefação, que dá prova todos os dias que não quer e não pode resolver os imensos problemas sociais. O Estado burguês tem outra “solução”: implanta uma ditadura setorizada onde a maioria de seus moradores são negros, força de trabalho que move a cidade, mas que vive sob cotidianos massacres perpetrados por forças policiais, uniformizada ou em paisana. Até que os “escravos assalariados” nos rebelemos!

No caso da “Favela da Telerj”, que apenas teve uma existência de uma semana, não se podia utilizar o pretexto do tráfico de drogas. Então a justificativa foi a suposta “inviolabilidade da propriedade privada” (neste caso da empresa Oi, que a recebia como presente do roubo que foi a privatização da Telebrás). Naturalmente, o Estado capitalista violava massiçamente os direitos de propriedade dos pobres para construir obras para a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Isto aponta para outro dos grandes problemas que as pessoas enfrentam nesta sociedade capitalista em decomposição: a falta de moradia para os trabalhadores. Em parte devido ao boom da especulação imobiliária de construções para a Copa, os alugueis no Rio têm subido estrepitosamente e há uma escassez enorme de moradias. As 5.000 pessoas necessitadas, gente trabalhadora, que organizou a favela buscava uma solução ocupando um terreno abandonado desde anos atrás: morar aos olhos da burguesia, é um crime bárbaro! O “Minha casa minha vida”, é pura demagogia de Dilma.

O próprio Friedrich Engels escreveu uma série de artigos sobre A questão da habitação, em 1872 quando o capitalismo ainda estava numa fase ascendente. Mesmo naquele então, Engels explicou que construir casas adequadas para os trabalhadores era impossível numa economia guiada pela busca de lucro. Descreve como a burguesia “resolve” o problema, destruindo as habitações dos trabalhadores como fazia Haussmann em París para construir grandes avenidas de luxo, e como fazem hoje as grandes construtoras como Odebrecht para edificar enormes estádios em tempo de corrida, a um custo de numerosas mortes de trabalhadores da construção. Engels concluiu sua obra: “enquanto o modo de produção capitalista existir, será um disparate pretender resolver isoladamente a questão da habitação ou qualquer outra questão social que diga respeito à sorte dos operários. A solução reside, sim, na abolição do modo de produção capitalista, na apropriação pela classe operária de todos os meios de vida e de trabalho.”

Então, para lutar contra a desenfreada militarização impulsionada para a glória de Brasil S.A., se requer uma estratégia de revolução socialista. Devemos mobilizar a força da classe trabalhadora com a massa dos pobres, construindo comitês de defesa operária para unir a favela com a fábrica e os protestos de rua. Frente às metralhadoras do BOPE, BOE e Exército lutamos com nossos métodos, bem mais poderosos: contra abuso policial e militar, paralisar a cidade pela ação operária. Isolar o aeroporto, fechar o transporte público, fazer greves nas siderúrgicas e refinarias, levar professores e estudantes à rua. Ao mesmo tempo, os trabalhadores devem lutar para eliminar o desemprego de massas, criando milhões de empregos ao reduzir a jornada de trabalho sem redução de salário. Devem impor o controle operário e reivindicar a expropriação dos tubarões da construção para construir milhões de habitações para os trabalhadores.

Esta luta exige ultrapassar o economicismo sindical para entabular uma luta de classe. Os marxistas devem atuar, como insistia Lênin, como um tribuno do povo, denunciando todo ataque aos oprimidos. Lutamos contra a opressão secular da mulher, pelo direito a aborto livre e gratuito, por creches abertas 24 horas por dia, por salário igual a trabalho igual e para acabar com a violência de gênero. Lutamos pelo integracionismo revolucionário, pela integração inter-étnica de brancos, negros e indígenas, partes constitutivas da classe trabalhadora e da grande massa dos oprimidos. O combate contra o racismo não é apenas “uma coisa de negro”, é de todos nós. Quando pessoas de outras etnias olharem para as favelas no Rio, seja no Haiti, no Harlem, lembrem da imortal frase do principal mestre do socialismo: “O trabalho não será livre na pele branca enquanto na pele negra for marcado com ferro quente" (Karl Marx).”

E neste 50º aniversário do golpe militar-civil de 1964, devemos empreender uma luta revolucionária, comunista e internacionalista contra o imperialismo. Desde o primeiro momento do governo Lula, denunciamos que o PT no poder servia de xerife para Washington na América Latina, particularmente enviando PMs e tropas como mercenários para impor uma ocupação imperialista do Haiti. Assinalamos como as tácticas de contra-insurgência que se utilizavam no Haiti foram usadas também contra os negros pobres das favelas e na periferia de São Paulo. Por isto exigimos mobilizar a ação operária para expulsar as tropas e policias do Haiti e das favelas. Uma greve nas fábricas de Embraer e outras fábricas militares em São José dos Campos contra a ocupação do Haiti teria um impacto muito maior que centenas de protestos de rua.

Unimos nossa luta com a de nossos camaradas do Grupo Internacionalista, seção norte-americana de nossa Liga pela Quarta Internacional. E acima de tudo, buscamos criar um partido operário revolucionário, que luta por um governo operário-camponês que inicia a revolução socialista no Brasil, em o continente e no coração do império. Por uma federação de estados operários da América Latina! Fora filhotes dos milicos golpistas de 1964!

Reproduzimos aqui a moção introduzida pelo Comitê de Luta Classista e aprovada pela assembléia da rede estadual do SEPE-RJ no dia 10 de abril:

Mobilizar o poder da classe operária para expulsar as tropas de ocupação pró-imperialistas do Haiti, favelas e movimentos sociais

RIO DE JANEIRO, abril de 2014 – Tropas das Forças Armadas brasileira, do Exército, Marinha e Aeronáutica com reforço da Polícia Federal, das UPPs, PMs, Polícia Civil, X9 e P2 e ainda a Guarda Municipal, um pelotão com mais de três mil homens e mulheres com modernos armamentos de guerra convencional, invadem a favela do complexo da Maré a pretexto de “combater as drogas” e proteger a Copa do Mundo.

No entanto, enquanto isso, nos dois mandatos do ex. Governador Sérgio Cabral foram fechadas 374 escolas, sendo que 157 destas fechadas entre 2010 e 2014 (sitio do Sepe). Também escolas começam a serem ocupadas pelas UPPs, conforme moção de repúdio no site do Sepe, dia 31/03/2014, a qual diz o seguinte:

“O Sindicato dos Profissionais da Educação - SEPE-RJ repudia a presença da unidade de apoio da UPP dentro do terreno da escola estadual CAIC Theophilo de Souza Pinto, localizada na comunidade Nova Brasília, no Complexo do Alemão. A presença ostensiva de policiais fortemente armados na entrada e no interior da escola põe em risco toda comunidade escolar, violenta princípios pedagógicos e limita consideravelmente o desenvolvimento da educação.”

“Comemorando” os 50 anos do golpe civil-militar, a Frente Popular e seu triunvirato, Eduardo Paes, Cabral-Pezão, Dilma no Planalto e a direita, coloca o Rio de Janeiro em Estado de Sítio! Favelas se transformam em territórios ocupados com militares atacando negros e pobres!

A “democracia” dos frentes populistas burgueses pró-imperialistas fazem troca-troca de tropas policial-militar, entre favelas no Haiti e cariocas, um indisfarçável cunho racista.

É necessário:

– Mobilizar a classe trabalhadora e sua força e em particular os sindicatos em defesa contra os ataques da polícia!
– Pela formação de comitês operários de defesa com base nos sindicatos para proteger os protestos e as favelas!
– Derrubar as muralhas de aço da Maré!
– Expulsar as tropas de ocupação pró-imperialistas do Haiti, favelas e movimentos sociais! ■