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Vanguarda
                Operária

junho de 2012

Educação de qualidade, um direito de todos – Não é uma mercadoria

Professores, Alunos: Trituramos o SAERJ
Enganação aos estudantes e pais
Arma do capital contra os professores
Garrote para estrangular a educação pública



Professores do Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação-Rio de Janeiro na recente greve no
municipio de São Gonçalo. 
(Foto: SEPE-RJ)

Para quarta- e quinta-feira, nos dias 27 e 28 de junho, mais uma vez nestes 2012, está planejado uma paralisação do magistério fluminense com um propósito extraordinário: boicotar a prova SAERJ. O Sistema de Avaliação da Educação do Estado de Rio de Janeiro nada tem que ver com um diagnóstico científico do desenvolvimento pedagógico dos alunos. Da mesma forma que a Prova Brasil, o exame nem sequer mede o nível de aprendizagem, e muito menos a capacidade de análise, de pensamento crítico e de exprimir-se. Ao reduzir a educação a um número baseado em respostas a um teste estandardizado de múltipla escolha desenhado para ser corrigido por máquina, o SAERJ é um engano aos estudantes e pais e uma arma do capital contra o magistério. É uma arma do inimigo na ofensiva capitalista para privatizar a educação pública. O professorado junto com os alunos, pais e trabalhadores devemos mobilizar nossa força para retalhar a prova-embuste e impedir sua aplicação.

A greve convocada pelo Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação de Rio de Janeiro (SEPE) não é um evento isolado, local. O SAERJ imposto por Sérgio Cabral é peça chave do Plano de Metas, é somente a mais recente de uma serie de “reformas” falidas à educação promovidas por governadores sucessivos e dos governos federais sob Henrique Cardoso e Lula. Como o programa da Nova Escola imposto pelos Anthony Garotinho, e Rosinha, procura subornar os professores com promessas de uns poucos reais além de seus miseráveis salários. Em troca exigem a aceitação de um sistema de avaliação derivado em grande parte dos resultados dos alunos nos “provões”. Desta maneira os políticos burgueses tentam ligar a paga dos educadores com o “produto”, como se a educação seria uma mercadoria que se compra num mercado e não um direito democrático fundamental dos trabalhadores e de toda a população.

Ao nível nacional, o Plano de Desenvolvimento da Educação lançado pelo governo Lula se baseia na Lei de Diretrizes e Bases da Educação aprovado no governo de FHC, que declarou o ensino “livre à iniciativa privada”, permitiu o financiamento de escolas privadas “sem fins lucrativas”, e promoveu bolsas para escolas privadas. O PDE lulista é também produto da iniciativa “Todos pela Educação” patrocinado pela alta finança (Bancos Santander, Itaú, Unibanco, Bradesco) e grandes empresas (Gerdau, Suzano), para monitorar a “boa gestão dos recursos públicos investidos na Educação”. E sobretudo responde às diretrizes das instituições financeiras imperialistas, notavelmente o Banco Mundial e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico que enfatizam a gestão empresarial do ensino para aumentar a “produtividade” dos professores. Daí vem o SAERJ e demais “provões”.

Ao convocar a paralisação da rede estadual, o SEPE com justeza salienta que estes testes responsabilizam os educadores pelos resultados de “décadas de descaso e desmonte da escola pública”. A falta de investimento, as salas apertadas, os computadores, laboratórios e bibliotecas inadequados ou inexistentes, os salários de miséria da categoria e as duras condições de vida dos alunos são todos os fatores que incidem na qualidade da educação e são ignorados pelo SAERJ. “Premiar” ou “punir” professores e funcionários conforme os resultados das provas não só é injusto, não só fomenta a fraude, introduz uma competitividade ruim numa empresa (a educação) coletiva e colaborativa. Mas a conclusão que tira a direção reformista do sindicato é sugerir ao secretário de educação por fim às bonificações por “produtividade”, abrir uma “discussão” sobre as condições necessárias para uma educação de qualidade e construir “um projeto político-pedagógico de cada escola”! Uma receita para a derrota.

Faixa do Comitê de Luta Classista num protesto do SEPE-RJ.
(Foto: CLC)

Quando generalizam a temática, os diretores do SEPE criticam o “neoliberalismo”, quer dizer, a política de “mercado livre” que domina a economia política burguesa na atualidade. Mas isto não é uma discussão sobre reformas para melhorar a aprendizagem. Tampouco se trata de uma política que pode ser substituída por outra. É uma guerra dos capitalistas para esgotar e privatizar a educação pública, demolir os sindicatos do magistério e intensificar a exploração dos professores. Por isso, o Comitê de Luta Classista (CLC) insiste que temos que responder com as armas da guerra de classes. A paralisação chamada pelo SEPE depois de tentativas anteriores de boicote ao SAERJ é um começo. O combativo professorado mexicano tem avançado a outro nível ao deflagrar greves para impedir tais “avaliações” tendenciosas. E por ser uma ofensiva do imperialismo, do capitalismo em sua fase de decadência, de destruição sistemática das conquistas do passado, o sindicalismo reformista do passado não serve – precisa-se uma resposta internacional revolucionária.

Mercantilização da educação: A experiência norte-americana

Os Estados Unidos é um dos países onde as “reformas” corporativas da educação pública mais têm se aprofundado nos últimos tempos. Desde 1983, ao começo do governo do conservador Ronald Reagan, publicou-se um estudo com o título Uma nação à risca: o imperativo da reforma educativa, que foi avalizado pelos dois partidos sócios do capitalismo norte-americano, republicano e democrata, os quais, a respeito da educação, são verdadeiramente partidos gêmeos. Apresentando o tema em termos de seguridade nacional naquela época de Guerra Fria antisoviética, colocou a responsabilidade pelas deficiências da escola pública nas costas dos professores. Colocou que os salários dos educadores deveriam “ser profissionalmente competitivos, responder ao mercado e basear-se no rendimento”. Desde então, a arremetida contra o magistério e em particular seus sindicatos não tem cessado nem sequer um minuto.

Porém, os bate-professores profissionais ficam frustrados diante a força do sindicalismo docente, um dos poucos setores sólidos de um movimento sindical duramente enfraquecido. Recentemente há um aumento de resistência entre os educadores ativistas aos ataques do governo, particularmente em torno ao fechamento de escolas “falidas”. Esta política racista tem produzido uma aproximação dos professores com os bairros negros e latinos afetados pela operação de demolição da educação pública. Ao mesmo tempo cresce a oposição ao regime de avaliação educativa por “provões” que prejudicam professores iguais que alunos.

Uma das figuras mais destacadas nesta dissidência é a historiadora Diane Ravitch, antiga subsecretária de educação no governo de George Bush I. Sua crítica dos efeitos da política de testes padronizados, responsabilização do professor pelos resultados dos alunos e fechamento de escolas adquire ainda mais força por ser ela ate há poucos anos uma das principais defensoras e protagonistas da mesma política de reforma educativa corporativa. O SEPE faz circular uma entrevista com Ravitch com O Estado de S. Paulo (2 de agosto de 2010) onde critica: “A administração do presidente Obama continua aceitando a abordagem punitiva que começamos no governo Bush. Privatizações de escolas afetam negativamente o sistema público de ensino.... E a responsabilização dos professores está sendo usada de maneira a destruí-los.”

Para Ravitch é muitos pedagogos, é bastante detalhar estes efeitos contraproducentes. Mas pelos arquitetos destas “reformas”, pelos governos capitalistas que as implementam e pelas agências financeiras imperialistas que as promovem, os resultados pedagógicos são inteiramente secundárias. A intenção não é melhorar a “educação por todos” – isto é somente a propaganda promocional. Os promotores da mercantilização da educação – os executivos do Business Roundtable, ou “filantropos” como Bill Gates de Microsoft e a família Walton, da WalMart – querem afastar os atuais professores da profissão, arrasar os sindicatos docentes, diminuir o gasto da educação pelo erário, e converter as escolas públicas em fontes de lucros (mediante contratos, parcerias, etc.) e centros de treinamento da força laboral pelos empregadores. A educação de qualidade seria restringida aos filhos da burguesia e alta pequena burguesia

Além da crítica, para quem quer realmente defender a escola pública e lutar por uma educação de qualidade para todos, apresenta-se a questão de se deve fazer para derrotar o embate. Se no Rio, o SEPE-RJ dá um passo de resistência com a paralisação dos dias 27 e 28 de junho, os sindicatos docentes norte-americanos, o AFT e a NEA, capitulam vergonhosamente à investida corporativa. Aceitam que os testes sejam utilizados como base da avaliação do professor, só os querem limitar a 40% dos pontos. Os oposicionistas promovem um boicote das provas pelos pais, a título individual, tática condenada ao fracasso. Agora estão circulando um abaixo-assinado pedindo que os governos local, estadual e federal “reexamine o sistema de avaliação das escolas públicas” e que “desenvolva um sistema baseada em múltiples formas de avaliação que não requer muitas provas estandardizadas....”

Trabalhadores da Educaçõ de Luta Classista num protesto contra o fechamento de escolas, 26 de abril de 2012.
(Foto: The Internationalist)

Nos dois casos, da burocracia sindical e da oposição reformista, suas propostas refletem a ilusão de que nos estamos engajados numa conversa sobre como melhorar a educação. Entretanto, nossos camaradas da Class Struggle Education Workers (CSEW, Trabalhadores da Educação de Luta Classista), uma corrente oposicionista nos sindicatos do magistério de Nova Iorque, defendem ocupar as escolas ameaçadas com fechamento por professores, alunos e pais, e que o sindicato mobiliza sua força para impedir a realização dos testes, se necessário por meio da greve. (É ilegal no estado de Nova Iorque que os professores fazem greve por qualquer motivo.) E enquanto a burocracia e as oposições apoiaram em sua grande maioria o candidato do Partido Democrata Barack Obama em 2008, a CSEW, ligada ao Grupo Internacionalista, seção norte-americana da Liga pela Quarta Internacional, chamou a não apoiar nenhum dos partidos capitalistas e lutar por um partido operário de luta de classes.

Luta sindical combativa no México

A proposta da CSEW pode parecer muito avançada no contexto dos EUA, mas no México tem-se realizado recentemente com combativas greves. Nos estados de Chiapas, Oaxaca, Guerrero e Michoacán abrangendo dezenas de milhares de professores impediram a realização de um provão nacional dos estudantes (o ENLACE) e a “avaliação universal” dos conhecimentos dos professores. Não só paralisaram a atividade escolar, fechando as escolas, os sindicalistas ocuparam os ministérios estaduais da educação e, como precaução resguardaram os depósitos onde foram guardados os exames. Em três estados, obrigaram os governos a assinar acordos de não administrar as provas, e no caso de Oaxaca, onde dezenas de milhares de professores ocuparam o centro da capital durante duas semanas, equipes de uns 500 sindicalistas faziam rondas aos lugares aptos para fazer exames para assegurar-se que não se fizesse.

Em México, o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Educação (SNTE) não é um sindicato operário e sim um organismo do estado para controlar os professores. É um dos principais pseudo-sindicatos “corporativistas” herdados do regime do partido de estado do PRI, semelhantes na integração no estado capitalista aos sindicatos pelegos brasileiros nos tempos do Estado Novo varguista ou da ditadura militar. A atual “líder vitalícia” do SNTE, Elba Esther Gordillo, foi instalada em 1989 como presidenta do grêmio (e seu antecessor Carlos Jonguitud foi removido) pelo então presidente da república, Carlos Salinas de Gortari, em reunião privada. Sob Jonguitud e Gordillo, pistoleiros do “sindicato” assassinaram bem mais de 100 membros da entidade. Atualmente, o SNTE apóia um “Acordo pela Qualidade Educativa” (ACE, pelas siglas em espanhol), que inclui o provão ENLACE e a “Avaliação Universal” dos professores.

Em luta contra os burocratas charros (pelegos) do SNTE surgiu nos anos 1980 uma corrente opositora, a Coordenadora Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), que atualmente e desde muitos anos controla as seções locais do SNTE nos estados de Chiapas, Guerrero, Michoacán e Oaxaca, com forte implantação no distrito federal e outros estados. A CNTE atua como organização independente, convocando greves estendidas de até meio milhão de professores. A Seção XXII SNTE-CNTE em Oaxaca foi a força principal da tumultuosa revolta que expulsou o governo, a polícia e demais órgãos repressivas da capital estadual durante mais de cinco meses em 2006. Em 2012, a Seção XXII, depois de uma marcha de 50.000 professores no dia 15 de maio, o dia 21 deflagraram uma greve indefinida. Dezenas de milhares de maestros ocuparam 20 blocos do centro de Oaxaca. Uma semana mais tarde, a CNTE convocou uma greve nacional exigindo a não implementação da ACE “e todos seus programas”.


15.000 manifestantes, convocados pelos professores dissidentes da Seção XXII do SNTE-CNTE,
marcham em Oaxaca o 14 de junho para conmemorar a repressão e resistência de 2006.
(Foto: Sección XXII, SNTE-CNTE)

Em Oaxaca, a greve se manteve durante duas semanas e meia, logrando que o governo estadual satisfizesse todas as demandas do magistério. O ACE é cancelado, também o ENLACE e a avaliação dos professores, e se outorgue financiamento de programas alternos negociado com a Seção XXII. Em Chiapas também o governador acordou cancelar o provão estudantil. Nesse estado, Guerrerro e Michoacán, onde a mobilização do magistério dissidente foi mais fraca que em Oaxaca, logrando fechar entre 25% e 50% das escolas, o professorado embora pudesse bloquear os exames dos alunos e alguns da categoria em muitos municípios com ocupações das instalações dos ministérios da educação estaduais e dos depósitos onde “resguardaram” os exames. Depois de um mês de mobilizações massivas, o secretário de gobernación (ministro do interior, chefe da casa civil) federal aceitou negociar sobre a avaliação dos professores.

Ficou evidente o grande poder de convocatória, a combatividade e a tenacidade dos professores dissidentes da CNTE ao fazer frente ao estado capitalista. Em meio da campanha pelas eleições do 1 de julho, a imprensa e os canais televisivos quase unânimes condenam constantemente os docentes em luta. (Em contraste, eles dão uma cobertura muito favorável ao novo movimento de estudantes pequeno-burgueses, #YoSoy132, que exigem eleições limpas.) Todavia os sindicatos “independentes” (organizativamente) do controle corporativista ficam politicamente subordinados à burguesia. Hoje, como também fez em 2006, a CNTE chama efetivamente a votar pelo candidato da frente popular de oposição, Andrés Manuel López Obrador, não obstante seus partidários do Partido da Revolução Democrática apoiaram a repressão sangrenta em Oaxaca em 2006 e hoje também criticam os professores.

Nossos camaradas do Grupo Internacionalista mexicano, ao contrário do movimento #YoSoy132, apregoam o voto nulo nas eleições, ao opor-se a todos os candidatos, partidos e coalizões burgueses. Eles defendem os professores da CNTE e participam em suas mobilizações. Chamam, como também fazem o Comitê de Luta Classista no Brasil e o CSEW nos Estados Unidos, pelo governo quadripartido das escolas por assembléias dos professores, estudantes, funcionários e pais. São tais entidades democraticamente eleitas que devem avaliar o desempenho dos alunos e docentes, e não algumas autoridades capitalistas que buscam aniquilar os sindicatos e submeter a o ensino público às ordens do capital. Nós insistimos: Sérgio Cabral, Lula, capitalistas e imperialistas, tirem as mãos de nossas escolas! Nós educamos, nós decidimos!

A Liga Quarta-Internacionalista do Brasil (LQB), junto com os Grupos Internacionalistas no México e os EUA, procura formar o núcleo de um partido operário revolucionário, leninista e trotskista, que luta pela revolução socialista internacional, a precondição para estabelecer uma educação verdadeiramente ao serviço dos trabalhadores e todos os oprimidos.


E-mail: internationalistgroup@msn.com

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